Povoados Pré-históricos em Portugal

 Os principais vestígios de povoados pré-históricos fixados durante o período calcolítico, naquele que é atualmente o território português, concentram-se na região da Estremadura. Entre eles destaca-se Vila Nova de São Pedro, na Azambuja com as suas três linhas de fortificação. Situado no vale do Tejo, com ótimas condições naturais para a prática da agricultura e da pastorícia, que de resto eram aspetos capitais na escolha dos locais onde se fixavam as populações, foi ocupado em vários períodos distintos, conforme atestam os diferentes fósseis diretores ali descobertos, permitindo desde logo identificar três tipos distintos de cerâmica: copos canelados, cerâmica com decoração “folha de acácia” e campaniforme. Leceia, em Oeiras, é outro importante e comercialmente dinâmico povoado fortificado, ocupado em pelo menos quatro períodos, com a atividade agrícola praticada nos terrenos adjacentes, principalmente o cultivo de cereais e gramíneas, a ter especial relevância para as comunidades ali instaladas até, crê-se, cerca de 2300 a.C. Será um dos povoados calcolíticos com maior área escavada, de forma metódica desde 1983, tendo sido recolhidos cerca de 130 artefactos, entre os quais inúmeros testemunhos da cultura campaniforme, que também marca presença no espólio recolhido no castro do Zambujal (Torres Vedras), onde coexiste com cerâmicas caneladas com decoração “crucífera” e “folha de acácia”. As percentagens de estanho nos objetos ali descobertos evidenciam a transição da prática metalúrgica do cobre para o bronze, sendo igualmente evidentes sinais de acumulação de riqueza atento o tipo de ornamentos encontrados.

Não obstante os artefactos associados a cada fase de ocupação dos diversos povoados variarem e entrecruzarem-se entre períodos cronológicos, podemos distinguir quatro fases culturais distintas do Calcolítico da Estremadura, estando, cada uma delas, associada a diferentes tipos de espólio e características socioeconómicas das populações. A primeira fase, o Neolítico Final, período que se pode datar entre 3400 e 2900 a.C., é caracterizado pela utilização de taças carenadas, vasos de bordo dentado e o surgimento das pontas de seta. Embora não tenham sido localizados indícios da construção de estruturas defensivas, assiste-se neste período à fixação das populações em locais com aquelas características naturais, nomeadamente em lugares rochosos e elevados. No período seguinte, o Calcolítico Inicial, correspondente ao intervalo entre os anos 2800-2500 a.C., praticamente desaparece a cerâmica característica do período anterior, dando lugar às taças e copos canelados, sendo igualmente descobertas pontas de seta de sílex, artefactos relacionados com a prática agrícola e identificadas estruturas habitacionais distintas na qualidade da sua habitabilidade, indiciando um tipo de sociedade já plenamente afastada do modelo tribal, estratificada socialmente e com tarefas divididas entre os elementos da comunidade. A transição para o Calcolítico Pleno terá ocorrido cerca de 2600 a.C., quando se observa o surgimento da decoração de “folha de acácia” e a utilização de vasos esféricos para guardar provisões. São produzidos objetos em cobre, metal tardiamente introduzido na Estremadura, destinados a substituir, com maior eficácia, outros em pedra ou osso, e ainda outros utilizados em rituais ou como peças prestigiantes. As fortificações dos povoados que, inicialmente primitivas, foram evoluindo para muralhas e depois fortalezas, indiciam claramente a existência de conflitualidade e objetivos de proteção das populações e dos seus bens. A este nível existem diversas hipóteses que procuram explicar as motivações, quem seriam e qual a origem dos antagonistas. Uma dessas hipóteses, com contornos colonialistas, aponta no sentido de povos do Próximo Oriente terem chegado por via marítima em busca de minério, fomentado a sua pesquisa junto dos indígenas e florescido economicamente, havendo necessidade de erigirem fortificações para se protegerem de grupos rivais ou das próprias populações autóctones menos avançadas social e culturalmente. Existe depois a possibilidade da rivalidade se verificar entre grupos autóctones, fazendo-se uso de muralhas, torres e bastiões que se mostram não só com características semelhantes entre os diversos povoados, pese embora condicionadas face às singularidades geográficas, mas também arquitetonicamente análogas às fortificações que se podem encontrar nos povoados fixados ao longo do Mediterrâneo. Por outro lado, a construção de fortificações poderia traduzir não uma situação de conflitualidade existente mas tão só terem um carácter preventivo, dissuasor e simultaneamente constituir um fator de prestígio e de coesão interna, refletindo a complexidade social e dinamismo económico das populações hierarquicamente organizadas, fenómenos aos quais não seriam alheios o intercâmbio comercial e cultural com outros povos. Finalmente o Calcolítico Final, período que antecede a Idade do Bronze, decorre durante a segunda metade do III milénio a.C. quando se assiste a uma falência do modelo de desenvolvimento das comunidades dando origem a uma maior dispersão e desagregação dos povoados e um progressivo abandono das grandes estruturas fortificadas.

 

 

Bibliografia

CARDOSO, João Luís – O Calcolítico da Baixa Estremadura: Contributos para um ensaio, a propósito de Leceia, Estudos arqueológicos de Oeiras, Volume 8, Câmara Municipal, 1999/2000, pp. 325-353, ISSN 0872-6086, acessível online no Repositório Aberto da Universidade Aberta

CARDOSO, João Luís – Pré-história de Portugal, Universidade Aberta, 2007 (acessível na área de e-learning da Universidade Aberta)

 

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