Cerca de 9 biliões de anos depois do evento que deu origem ao universo, um planeta estabilizava-se na orbita de um sol situado na via láctea, a uma distância precisa que se viria a revelar ideal para o surgimento de um ambiente propicio à vida. Seria, contudo, necessário decorrerem ainda cerca de meio bilião de anos para que, por circunstâncias que se presumem relacionadas com reações químicas, surgissem os primeiros organismos unicelulares naquele terceiro planeta mais próximo do sol. Só muito milhões de anos depois surgiriam os organismos multicelulares, prosseguindo assim a vida na Terra numa imparável continuidade evolutiva que Charles Darwin tão bem explicou na sua obra de 1859, “A Evolução das Espécies”.
As
condições ambientais que hoje o planeta Terra possui, que o caracterizam como
um planeta singular e fervilhante de vida, foram, portanto, o resultado de
biliões de anos de um trabalho em constante progresso que resulta da interação recíproca
entre múltiplos elementos e fenómenos naturais, como o clima, o relevo, a
geologia ou a hidrografia, e também espaciais, como a meteorização. Um logo trabalho
de terraformação ao qual o Homem foi até certa altura completamente alheio,
ainda que não resistisse a reivindicar tal tarefa como sendo obra de deuses,
muitos deles, obviamente à sua imagem.
No
calendário cósmico, popularizado pelo cientista Carl Sagan, a história da
aventura humana no planeta ocupa uns escassos segundos do último dia do ano. A
sobrevivência e a ascensão da espécie dominante, tal como aconteceu com outros
animais, dependeu da sua capacidade de adaptação a várias circunstâncias
naturais que também a moldaram física e psicologicamente.
Desde
cedo o homem se destacou pela sua capacidade de não só se adaptar como também
de se apropriar e moldar o meio físico onde estava inserido, viciando assim os
dados de um jogo até então regido apenas por leis naturais ou fatores aparentemente
aleatórios que de modo algum podia influenciar. O sucesso das grandes
civilizações dependeu dessa aptidão, dessa capacidade de interferir no
geossistema. Veja-se a título de exemplo a civilização Egípcia que prosperou
precisamente pela capacidade de “domar” o rio Nilo, alterando o seu curso ou
controlando os seus períodos de cheias, manifestamente provocando um impacto
não só em termos paisagísticos, mas também com repercussões ao nível climático
da região.
A
geografia física, como disciplina que busca por explicações e correlações entre
as causas e os efeitos dos diversos fenómenos naturais, ocupou um legar de
destaque entre as demais disciplinas científicas e sociais aquando do
estabelecimento dos impérios, quando as nações tiveram necessidade de conhecer
com maior profundidade os seus domínios territoriais. Atualmente tem, no
espectro científico, especial relevância atento o seu objeto de estudo centrado
nos fenómenos físicos e biofísicos, quando assistimos a múltiplas manifestações
do poder e engenho humanos de interferir de uma forma (quase sempre) negativa
nas condições ambientais do planeta. Mais do que nunca, existe a necessidade monitorizar
e contabilizar o alcance da ingerência humana na “saúde” do planeta, encontrando
respostas e antecipando cenários, contrariando a desarmonia crescente entre o
homem e a natureza, em prol de um desenvolvimento sustentável que satisfaça as
necessidades atuais sem comprometer a existência das gerações futuras.
A
degradação ambiental do planeta tem sido cada vez mais visível desde a
revolução industrial, prevendo-se uma radicalização da amplitude de certos fenómenos
naturais que, pela sua singularidade, os cientistas identificam como sendo
inequivocamente resultado da ação humana e dos desequilibro que a sua atividade
provoca, podendo indiciar a incapacidade do planeta se regenerar e entrar num
processo degenerativo.
Existem
quatro domínios do estudo da geografia física que estão intimamente
relacionadas com as questões ambientais que, no atual contexto de consciencialização
ecológica merecem destaque. Note-se que o galopante avanço no conhecimento cientifico
verificado nos últimos anos, nomeadamente das condições ambientais de outros
planetas do sistema solar, onde se destaca Marte como destino próximo da humanidade,
por serem tão inóspitas e adversas à vida, poderão estar a contribuir para essa
consciencialização, para a importância de preservação do “paraíso” terrestre.
A
climatologia é um desses domínios que estuda especificamente as alterações das
condições atmosféricas numa ótica de médio e longo prazo, sendo certo que os fenómenos
climáticos que ocorrem na atmosfera terreste, como a temperatura, a radiação solar,
o vento ou a precipitação, têm um impacto decisivo e condicionante da atividade
humana. Crê-se que a produção e libertação de gases poluentes para a atmosfera possam
estar a comprometer a camada de ozono do planeta que funciona como um
importante filtro da radiação ultravioleta emitida pelo sol, altamente nociva
para os seres vivos.
As
condições climatéricas estão por seu turno também relacionadas com a
geomorfologia, verificando-se coincidências entre diferentes tipos de clima
consoante o tipo de relevo que, no planeta, encontra-se em constante mais ou
menos visível mutação, quer por força de fatores exógenos, nomeadamente por
ação dos elementos naturais como o vento ou a chuva, quer por fatores
endógenos, como sejam a atividade vulcânica ou tectónica. O impacto da
atividade humana ao nível geomorfológico faz-se também sentir principalmente
por força da urbanização de espaços, da exploração agrícola dos solos e pela
mineralização ou extração de recursos naturais do subsolo.
Os
dois domínios já referidos interagem diretamente com um terceiro domínio de
estudo da geografia física, a biogeografia, que estuda a repartição espacial
dos seres vivos pelo planeta cuja maior quantidade de espécies se concentra na
faixa equatorial, onde as variações climáticas são menores. Problemas diretamente
causados pela atividade humana como a desflorestação, e indiretamente como as alterações
climáticas e o aumento das temperaturas, podem provocar mudanças profundas nos
ecossistemas, levando a migrações de espécies e até ao seu desaparecimento.
Ocupando
mais de dois terços da superfície terreste, a água, elemento essencial à vida,
constitui o objeto de estudo da hidrogeografia. O aumento exponencial do número
de seres humanos no planeta traduz-se num consequente aumento de consumo de
recursos naturais, entre os quais a água, um recurso finito e que já foi
apontado como uma das grandes fontes de conflito entre as nações num futuro
próximo. As reduções ou extinção de glaciares e das calotes polares estão a
provocar um aumento gradual do nível do mar, prevendo-se num futuro não muito
longínquo a inundação permanente de diversas zonas costeira atualmente com uma
grande densidade populacional.
Vista
do espaço, a atividade humana e os seus efeitos sobre o planeta tendem a assemelhar-se
à atividade de um qualquer vírus parasita que se multiplica imparável num
organismo vivo, corrompendo e ocupando cada vez mais tecido vital. Importa
contrariar esta visão quase grotesca e a ideia de que o homem pode destruir em
segundos do calendário cósmico o que demorou biliões de anos a construir,
cabendo à geografia física um papel muito importante na preservação da natureza,
do ambiente, da beleza e da cor azul que caracteriza o planeta Terra.
Bibliografia
Diversos
textos de apoio acessíveis na Plataforma de E-Learning da Universidade Aberta, na
disciplina de Geografia Física e Ambiente.
MONTEIRO,
Rafaela Martins, GRANGEIRO, Cláudia Maria Magalhães – A Geografia e os Estudos
Ambientais, Revista da Casa da Geografia de Sobral, Sobral/CE, v. 17, n. 3, p.
5-20, Dez. 2015. Disponível na internet em http://uvanet.br/rcgs.
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